quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

O Grego

O Grego vivia em uma cidadezinha de interior, cidade essa que fazia fronteira com um país ainda piorzinho, e falava oito línguas. E eu me perguntava, porque o Grego vivia no interiorzão se falava oito línguas, tinha ‘boa’ cultura ou não esse grego? ‘Tupi, or not tupi that is the question’.
Certo que o Grego saiu fugido de todos os países os quais aprendeu todas essas línguas, se é que aprendeu mesmo, pois além de ‘ok’, ‘je peut parle français’ e um português bem escutado, porém com vários erros de conjugação, não escutei nada mais; nada mais que pudesse ter impressionado minha pobre cultura lingüística de três línguas e duas meias; meias essas sujas e chulezentas.
Mas nada disso tinha importância, o que importava é que o real conhecimento do grego era das polícias locais. Sabia dos federais, dos militares e dos civis. Sabia muito bem que os federais só levavam em cana se encontrassem de quilo pra cima, que os militares te levavam por qualquer papelotinho e não sabiam o que fazer com você e seus papelotinhos e que os civis eram comprados por qualquer trocado porque não queriam passar trabalho.
Os federais vendiam o quilo e se faziam ricos; os militares te soltavam logo que nomeasse um conhecido qualquer, seja um importante político ou delegado, ou o comerciante da mercearia da esquina; e os civis fumavam o teu papelotinho, isso se você não fosse tão mão fechada e não se desse ao trabalho de pagar alguns trocadinhos a mais para pedir o papelotinho de volta, ao invés de ir comprar novamente outro por um pouco mais barato que o trocadinho da propina.
A verdade é que o Grego, além de ser o tradutor oficial dos federais - diz ele -, passou férias na Grécia junto com o delegado; e nos deu todo esse discurso das polícias locais só para nos deixar tranqüilo e relaxado para que pudéssemos fumar sem preocupação na rua, e não tivéssemos o incomodo de fumar o papelotinho trancafiados no quartinho do hotel baratinho.
De moto-taxi foi e voltou relativamente rápido; sentou, tomou um copo de guaraná e comeu um pedaço da nossa pizza - metade frango catupiri metade vegetariana – e escolheu frango catupiri, por que o Grego não é bobo nem nada. O grego nos contou mais um par de histórias e se levantou para ir embora, não antes de mostrar um papelotinho, um pouco mais suspeito e um pouco mais branquinho que o nosso, e dizer que tinha outra entrega meio que urgente. Marchou pra ir embora, deu dois compridos passos e voltou. Mostrou-nos os guardanapos da mesa e disse que aquilo também servia no caso de que não tivéssemos nada melhor, e levou um guardanapinho com ele; já que quem faz uma compra para alguém, sempre leva um pouco da tal compra, e esse era o negocio do Grego.
O Grego não se importava em ganhar dinheiro, naquela cidadezinha de fronteira do interior, dinheiro não servia para nada; ao grego interessava fazer ‘cambios’, e no cambio com agente, além de um papelotinho, ou dois, que levou com ele, ainda levou um pedaço de pizza frango catupiri e um copo de guaraná; que mais poderia querer o Grego?
Seguindo o conselho do Grego – que papero ou não, mas de algo sabia – usamos o guardanapo ao invés de voltar pro apertado quartinho do hotel baratinho. Passaram os federais e perceberam que eram só três garotinhos com uns papelotinhos que não valiam à pena; passaram os militares e averiguando que minha carteira de identidade era de filho de militar, decidiram não nos incomodar; passaram os civis e levaram os três papelotinhos, dos seis que nos sobravam.

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